Faz 60 anos…
Por Álvaro Silva (*)
A noite de 1º de abril de 1964 foi de busca de informações para muita gente em Vitória e cidades do mesmo porte. Afora Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre (para onde o presidente João Goulart havia se deslocado para ficar junto ao governador Leonel Brizola e tentar a resistência) e outras metrópoles, poucos tinham informações precisas sobre o que acontecia no Brasil e particularmente em Brasília. Era preciso esperar pelo noticiário noturno das TVs já controladas pelo novo governo ou adesistas a ele, ou nas rádios que estavam na mesma toada. Os jornais, esses circulariam no dia seguinte ainda sem sensores nas redações mas já com “orientações” sobre como noticiar o movimento que havia “salvo” nossa frágil democracia.
A cidade, com o por do sol, ficou ainda mais vazia. A maioria das pessoas não obrigadas a trabalhar à noite, preferiu se recolher mais cedo. E isso porque naquele mesmo dia começava, por parte dos militares a para eles incansável busca dos “subversivos”. Garoto, na época, eu não conhecia ninguém do gênero. Mas depois de adulto, trabalhando com jornalismo, acabei amigo de muitos dos que sobreviveram.
Os jornais, por sinal, eram precários e impressos em máquinas chamadas rotoplanas, com péssima qualidade de impressão. Na época nem existia diagramação em Vitória. Diagramação que por aqui chegou pelas mãos do artista gráfico e chargista José Antônio Nunes do Couto, o Janc, trazido para cá pelo diretor de A Gazeta Carlos Fernando Monteiro Lindenberg Filho, o Cariê, diretamente da Rio Gráfica e Editora (foto jornal de 1969). Diagramar era “desenhar” as páginas do jornal ainda na redação, numa reprodução das paginas chamado diagrama, colocando nelas todas as matérias, fotos, ilustrações, etc. Antes o que se fazia era descer tudo para oficina e lá, depois que os textos eram compostos, eles iam sendo colados nas páginas pelos gráficos. Quando o espaço era insuficiente, cortava-se o final das matérias e era colocado um “continua na página X”. Ficava tudo cheio de “joelhos”, mas era vida que segue… Por isso na época se dizia que pé de galinha e pé de matéria tinham sempre o mesmo destino, a faca ou tesoura. Então os repórteres concentravam o importante dos textos no início e deixavam o irrelevante para final. Os jornais de Vitória eram assim e não havia plantão para atualizar textos.
Sem informações precisas para obter e só com noticiário das TVs e rádios, vivemos do burburinho das conversas de rua com os vizinhos trocando impressões. A maioria, sem saber absolutamente em detalhes o que estava realmente acontecendo, achava que as autoridades estavam certas. Fui dormir naquela noite, assim como grande parte das pessoas de Vitória, sem ter um noção mais real do que se passava. Bom, porque muita gente não sabia de nada. Vovô e vovó tomaram a iniciativa de dizer que nos recolheríamos cedo. Mas antes uma informação ele tinha: haviam telefonado do Colégio Americano e dado uma boa notícia.
Ia haver aulas no dia 2 de abril!
___________________________
* Este texto, de número quatro, integra a série Faz 60 anos, de autoria de Álvaro José Silva, e disponível em https://blogdoalvaro.blogspot.com Álvaro José Santos Silva é capixaba de Vitória, jornalista profissional, escritor e durante anos, foi editor de A Gazeta. É, também, membro da Academia Espírito-santense de Letras e autor de biografias, publicações empresariais, romances e outras publicações e recentemente lançou o livro SE 206.