Jornalismo, resistência e machismo na produção da notícia
Postado em 14 mar às 15:20h
Por Soraia Chiabai (*)
Minha vida no jornalismo começou em meados dos anos 1980, na TVE, de onde migrei para novos enfrentamentos à realidade da profissão na redação de A Tribuna. Lá, comecei como repórter na editoria de Economia e me apaixonei pela profissão. A editoria era predominantemente masculina. Fui acolhida pelos colegas de trabalho que praticamente me ensinaram tudo, desde ligar o computador (sim, era a primeira vez que eu via aquele “monstro” na minha frente), até ter a melhor agenda de contatos das fontes.
A vida de repórter na rua nem sempre foi fácil. A maioria das fontes era basicamente de empresários e de políticos. Rapidamente aprendi que para me consolidar como profissional “de respeito” teria que seguir algumas regras. Usar roupas “adequadas” (decotes ou transparências, jamais) e fugir, sempre, de conversas que pudessem gerar proximidade e/ou intimidade eram princípios básicos.
Em uma época em que os homens se vangloriavam com máximas como “não existem mulheres virgens, mas apenas mulheres mal cantadas”, a “cantada” fazia parte da rotina. Entendi que estender a mão com o braço rígido era a melhor forma de cumprimento e que eu iria receber de “cara feia” toda e qualquer “piadinha” deixando claro, daquela forma, que eu estava ali para conseguir informações e, não, para conseguir “homens”. Assim fui me defendendo do ambiente machista.
Tempos depois, trabalhando na editoria de Economia de A Gazeta, enfrentei o desafio de ser mãe e profissional. Levar filho ao médico era impossível. Faltar trabalho só porque a criança estava doente? Jamais. Inúmeras vezes recorri a pessoas amigas para levar meu filho e eu conversava com o médico pelo telefone.
Toda mãe sabe da importância de estar presente na festa do Dia das Mães/Pais na escola do filho. Confesso: quando podia, eu fugia da redação para assistir à apresentação de meu filho. Eu era mãe e pai. Não podia falhar. E não falhei. Nem com meu filho e nem com o trabalho. Voltava correndo e entregava a matéria no horário estipulado.
Ao trabalhar como assessora de Imprensa, desta vez, no interior do Estado, voltei a lidar com um universo predominantemente masculino. Mas já estava tarimbada. Mantinha todos a uma distância adequada o que, certa vez, rendeu a fala típica do machista mais violento: “você só pode ser sapatão”. Não respondi. Só olhei com total desprezo.
Assim enfrentei o ambiente patriarcal do jornalismo e hoje me sinto totalmente vitoriosa por tudo o que conquistei como profissional, mulher e mãe.
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*Soraia Chiabai é formada em jornalismo pela UFES. Trabalhou em televisão, jornais e em assessoria de imprensa no Espírito Santo e, atualmente, cursa Ciências Sociais, também na UFES.